O meu bairro é mais típico que o teu

Desde os tempos do Liceu que não ouvia tantos palavrões. Aqui na rua há mesmo um "dialecto" próprio, o início e fim de cada frase têm um vernáculo associado, "tipo" muleta. Alguns homens madrugadores e despudorados, começam a treiná-lo logo pela manhã e são autênticos mestres.

A peixeira tira-me da cama antes de eu ainda sequer pensar em acordar e apregoa o peixe do dia como se todo o bairro fosse, ele próprio, o Bolhão. 

Mais tarde, quando desço a rua, encontro-a sentada à porta do Minimercado e faz o resto da manhã na conversa com os clientes que não são dela, mas que param para falar dos outros.

Também há uma Frutaria, onde a empregada ao serviço (calha-nos sempre a mesma) passa o tempo a intrigar contra a colega, imagino que não havemos de chegar a conhecê-la, entretanto será despedida.

Ontem ao sair do prédio, dei de caras com a a Dona Laurinda. Pediu-me imensas desculpas pois pensou que o meu filho era o meu namorado. Só por isso vai receber uma malga de marmelada.

Ao Sábado uma senhora de avental, canta o Fado numa esquina, rodeada de pombas.

Desengane-se quem pensa que nas cidades maiores já não se encontram os ofícios mais antigos. É muito fácil, basta percorrer umas poucas ruas e temos sapateiro, vidraceiro, carpinteiro, estamos cercados de tascas, há mercearia, drogaria, talho, serralheiro...

Temos todas as profissões aqui no bairro, todas mesmo, ainda não tivemos tempo de travar conhecimento com todos, mas já percebemos que o Barbeiro da frente, apesar de simpático, detesta que o fotografem.